Na edição dessa semana da Pesquisa Pronta do Superior Tribunal de Justiça, a Sexta Turma do STJ decidiu que no crime preterdoloso, espécie de delito qualificado pelo resultado, é possível a incidência da agravante genérica prevista no artigo 61 do Código Penal (AREsp 1.074.503).
Confira a ementa:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVOS REGIMENTAIS NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AGRAVANTE GENÉRICA. COMPATIBILIDADE COM CRIME PRETERDOLOSO. PRECEDENTES. OMISSÃO DO ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. AGRAVOS REGIMENTAIS IMPROVIDOS.
1. No crime preterdoloso, espécie de delito qualificado pelo resultado, é possível a incidência de agravante genérica prevista no art. 61 do Código Penal. Precedente. (AgRg no AREsp 499.488/SC, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 04/04/2017, DJe 17/04/2017.)
2. Não há violação dos arts. 619 e 620 do CPP, quando o Tribunal de origem enfrenta as questões relevantes ao deslinde da controvérsia, adotando, contudo, solução jurídica contrária aos interesses da parte.
3. Agravos regimentais improvidos.
(AgInt no AREsp 1074503/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 18/09/2018, DJe 25/09/2018)
Leia a íntegra do voto do Relator Min. Nefi Cordeiro (acesse a íntegra do acórdão):
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO NEFI CORDEIRO (Relator):
Quanto ao pleito recursal de THIAGO, admite-se a aplicação das agravantes genéricas (art. 61, II, a e c, do CP) ao crime de lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3º, do CP), pois, em se tratando de crime preterdoloso, em que há uma condução anterior dolosa com o resultado posterior culposo, é certo que a culpa decorrente do fato consequente não modifica a conduta dolosa de ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem, configuradora do crime de lesão corporal, sendo o resultado morte apenas uma elementar de maior punibilidade, o que permite a incidência das agravantes genéricas.
Ademais, como bem examinado o tema no voto da Ministra Maria Thereza de Assis Moura, publicado no Informativo 541 de 11/6/2014:
É possível a aplicação da agravante genérica do art. 61, II, “c”, do CP nos crimes preterdolosos, como o delito de lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3º, do CP). De início, nos termos do art. 61, II, “c”, do CP, são circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime, ter o agente cometido o crime à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação, ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido. De fato, apesar da existência de controvérsia doutrinária e jurisprudencial, entende-se que não há óbice legal ou incompatibilidade qualquer na aplicação da citada agravante genérica aos crimes preterdolosos. Isso porque, nos crimes qualificados pelo resultado na modalidade preterdolosa, a conduta-base dolosa preenche autonomamente o tipo legal e o resultado culposo denota mera consequência que, assim sendo, constitui elemento relevante em sede de determinação da medida da pena. Ademais, o art. 129, § 3º, do CP descreve conduta dolosa que autonomamente preenche o tipo legal de lesões corporais, ainda que dessa conduta exsurja resultado diverso mais grave a título de culpa, consistente na morte da vítima. Assim, no crime de lesão corporal seguida de morte, a ofensa intencional à integridade física da vítima constitui crime autônomo doloso, cuja natureza não se altera com a produção do resultado mais grave previsível mas não pretendido (morte), resolvendo-se a maior reprovabilidade do fato no campo da punibilidade. Além do mais, entende a doutrina que nos casos de lesões qualificadas pelo resultado, o tipo legal de crime é o mesmo (lesão corporal dolosa), não se alterando o tipo fundamental, apenas se lhe acrescentando um elemento de maior punibilidade. REsp 1.254.749-SC, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 6/5/2014
[…]
Vê-se, do excerto, que a irresignação do agravante, em que suscita omissão ou contradição, refere-se à falta de indícios acerca da autoria ou materialidade delitiva, visando a absolvição.
Sabe-se que não está o magistrado obrigado a rebater, pormenorizadamente, todas as questões trazidas pela parte, configurando-se a negativa de prestação jurisdicional somente nos casos em que o Tribunal de origem deixa de emitir posicionamento acerca de matéria essencial (REsp 1.259.899, Rel. Ministra Assusete Magalhães, DJ de 7/4/2014).
No caso, verifica-se, do acórdão recorrido, que a materialidade foi demonstrada por meio de provas documentais e orais, enquanto que a autoria ficou comprovada por meio de provas testemunhais e da vítima. Logo, não há falar em nulidade do julgado, já que não se trata de negativa de prestação jurisdicional, mas sim de irresignação quanto aos fundamentos adotados no aresto, que refutou, de acordo com o livre convencimento, os pontos relevantes ao deslinde da controvérsia, fundamentando sua decisão em elementos colhidos nos autos. Nesse sentido:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 619 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. EIVA INEXISTENTE. ACÓRDÃO ESTADUAL QUE DECIDIU A QUESTÃO DE FORMA FUNDAMENTADA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. AGRAVO IMPROVIDO. 1. No recurso especial, a parte pretende a declaração de nulidade do acórdão recorrido por ofensa ao art. 619 do CPP, ao argumento de que o Tribunal a quo não teria se manifestado em relação à omissão apontada pelo agravante. 2. É cediço que o puro e simples inconformismo do recorrente com a solução dada pela Corte a quo à controvérsia, não dá ensejo à oposição de embargos de declaração. 3. O julgador não está obrigado a refutar expressamente todos os argumentos declinados pelas partes na defesa de suas posições processuais, desde que pela motivação apresentada seja possível aferir as razões pelas quais acolheu ou rejeitou as pretensões deduzidas. 4. Na hipótese dos autos não se vislumbra a aventada negativa de prestação jurisdicional pela Corte a quo no julgamento dos embargos declaratórios, uma vez que foram refutadas todas as alegações do réu, ainda que de forma contrária aos interesses da defesa. […] 3. Agravo improvido. (AgRg no AREsp 463.300/PR, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 13/03/2018, DJe 23/03/2018.)
Assim, não vejo razões para modificar a decisão atacada que, inclusive, foi proferida nos termos da orientação jurisprudencial desta Corte.
Ante o exposto, voto por negar provimento aos agravos regimentais.
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